Cinco ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram pela manutenção do foro privilegiado de parlamentares, mesmo após a saída do cargo, nos casos de crimes praticados durante o mandato e em razão dele. O julgamento está suspenso por um pedido de vista (mais tempo para análise) apresentado pelo ministro Luís Roberto Barroso, que tem até 90 dias para devolver o caso.
O tema é julgado em um habeas corpus e por meio de uma questão de ordem em um inquérito. Os dois tratam do mesmo assunto. O primeiro caso teve três votos (do relator, ministro Gilmar Mendes, e Cristiano Zanin e Alexandre de Moraes). Na questão de ordem já são cinco votos – os mesmos do habeas corpus mais os dos ministros Flávio Dino e Dias Toffoli. Nesse caso, mesmo com o pedido de vista, falta apenas um voto para ser formada maioria.
O habeas corpus (HC) envolve o senador Zequinha Marinho (Podemos-PA). A defesa do parlamentar pediu um HC para que o STF julgue a acusação de suposta prática de “rachadinha” quando ele ocupava o cargo de deputado federal. Mendes votou por conceder o habeas corpus.
Já o inquérito apura suposto envolvimento da ex-senadora Rosilda de Freitas em delitos de corrupção passiva, fraude em licitação, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
O voto do relator nos dois casos defendeu que a prerrogativa de foro a parlamentares deve continuar mesmo após a saída do cargo em casos de crimes funcionais e que a nova interpretação deve ter aplicação imediata a todos os processos em curso, “com a ressalva de todos os atos praticados pelo STF e pelos demais Juízos com base na jurisprudência anterior”.
A tese proposta por Gilmar Mendes afirma que “a prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados no cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício”.
Flávio Dino fez uma sugestão de complemento à tese do relator. Para Dino, em qualquer hipótese de foro por prerrogativa de função, não haverá alteração de competência com a investidura em outro cargo público, ou a sua perda, prevalecendo o foro cabível no momento da instauração da investigação pelo tribunal competente.
O julgamento foi iniciado nesta sexta-feira (29) no plenário virtual do STF e tinha previsão de acabar em 8 de abril. No entanto, com o pedido de vista, o ministro Barroso tem até 90 dias para devolver o processo para julgamento.
Têm foro privilegiado no STF, pela legislação vigente, além de deputados federais e senadores, o presidente e o vice-presidente da República, ministros de Estado, integrantes dos tribunais superiores, membros do Tribunal de Contas da União e embaixadores.
No seu voto, o relator, ministro Gilmar Mendes, ressaltou que o seu entendimento agora é diferente da jurisprudência do STF e, por isso, propõe uma revisitação do tema. Em 2018, o tribunal decidiu que o foro só valeria para crimes cometidos no cargo e em razão dele. Na época, Barroso foi o relator da ação que representa a jurisprudência atual sobre o tema.
Acompanhando o entendimento do relator, Cristiano Zanin disse, em seu voto, que essa é uma “excelente oportunidade” para que o STF atualize sua jurisprudência.
“A jurisdição deve ser determinada pela qualidade do cargo do agente no momento do cometimento da infração funcional a ele imputada, mesmo que não mais esteja em seu exercício quando iniciado o procedimento criminal”, disse Zanin.
Após Barroso pedir vista, Alexandre de Moraes optou por antecipar seu voto. Ele afirma que após quase sete anos, a alteração das regras da prerrogativa de foro não demonstraram o resultado prático pretendido, não se verificando maior celeridade nos processos e julgamentos dos feitos declinados pelo STF às outras instâncias.
Ainda segundo Moraes, também não foi possível expurgar um receio que, historicamente, justificava a manutenção da prerrogativas de foro, a de que as justiças locais, desde o Império, atuavam com certo compadrio com as lideranças políticas locais.
Para o ministro, uma questão relevante nessa análise do foro é a necessidade de manutenção da prerrogativa de foro nas hipóteses da infração penal ter sido praticada no exercício do mandato e em razão de suas funções, mesmo após o término dos mandatos. “Dessa forma, acompanho o ministro Gilmar Mendes no sentido de estabelecer um critério focado na natureza do fato criminoso, e não em elementos que podem ser manobrados pelo acusado (permanência no cargo).”