O que vimos durante a última edição do South by South West (SXSW) foi o indicativo de uma nova Era na sociedade, e isso vai muito além de tendências citadas em painéis e palestras.
Frases e pensamentos de impacto ecoaram pelas enormes salas do evento, fazendo com que cada pessoa absorvesse de uma forma única aquela informação. Porém, a grande maioria saiu com um vazio dentro de si, tentando entender mais sobre o que nos reserva no futuro.
Quem procurou respostas, não encontrou, porque o futuro está sendo criado agora. E essa responsabilidade de encontrar essa conclusão foi exposta em palestras, como a da escritora Joy Buolamwini, ativista da justiça algorítmica. Citada pela Revista Fortune como a “Consciência da Revolução da IA”, é também conhecida como “Poetisa do Código”.
Joy colocou luz em questões que são velhas conhecidas da sociedade, como racismo e falta de igualdade de gênero, mas com o viés da inteligência artificial. Isso tudo é muito novo para todos e relevante nesse momento em que tudo evolui na velocidade da luz.
Entre as questões estão números e fatos que expõem falhas em biometria, por exemplo. Ela também trouxe um novo conceito: o “Racismo Biométrico”, para argumentar que mulheres negras estão mais vulneráveis às infrações dessa transformação digital. Perceber que elas estão mais suscetíveis aos erros da leitura da face, por exemplo, expõe um receio de recriar tudo que temos de equívoco na nossa sociedade no novo universo da inteligência artificial.
Em outro painel, a palestrante Sandy Carter, ex-executiva da IBM e da Amazon Web Services e atualmente diretora de operações da Unstoppable Domains, que é difícil fugir da tendência de as marcas recriarem seus universos físicos dentro do digital. Foi cirúrgica ao sugerir que “todos parem de resistir e simplesmente aprendam para se prepararem para essa nova era”.
Contudo, ao mesmo tempo em que as tendências foram apresentadas, a informação de Sandy chega ao mesmo lugar já apresentado por Joy: a entrada desses sistemas com base no aprendizado das máquinas traz problemas tão grandes quanto a evolução que a tecnologia representa para a humanidade. Questionamentos profundos sobre ética e confiança estiveram presentes em inúmeras sessões do evento em Austin, no Texas.
Mas há esperança – e, é muito inspirador também – quando vemos uma ativista digital como a Joy, mostrar toda sua força ao citar o conjunto de ações que já fez pela justiça algorítmica, brigando com gigantes, como IBM e Google, fazendo com que eles reconhecessem erros e tirassem alguns dos seus produtos do ar.
A autora fez ainda sua audiência dar gargalhadas por citar que somos todos especialistas nesta ciência, mas especialistas da “semana passada”, uma vez que nem tivemos tempo de evoluir até agora sobre o tema.
Enquanto Joy afirma que todos temos direito de proteger os nossos dados e influência para lutar por essa proteção, nos painéis que trataram dos temas de medicina, por exemplo, a abordagem da questão de uso de informações pessoais seguiu na direção oposta.
Não há como negar que uma das áreas em que a inteligência artificial pode trazer maior impacto positivo para a humanidade é a da medicina, com a ferramenta contribuindo na busca da cura de muitas doenças. Esse conhecimento será importante para que essa tecnologia emergente tenha material suficiente para trabalhar as pesquisas em larga escala.
Cientistas e especialistas veem com apreensão a possibilidade dos usuários terem receio de deixar seus dados em aplicativos e devices que ajudarão no mapeamento de doenças. Isso pode acontecer dentro do turbilhão de questionamentos e falta de confiança nas tecnologias digitais e na própria inteligência artificial.
A palavra “colisão” esteve presente em diferentes painéis do evento, sempre com o foco de mostrar que esse ecossistema sozinho não será utilizado de maneira correta e ética. No caso da medicina, os especialistas citaram que as curas e controle de doenças importantes acontecerão com a colisão de drogas, inovações e precisão do mapeamento do envelhecimento.
A inteligência artificial traz, sim, questões problemáticas que vamos ter que aprender a lidar e discutir, ou seja, nós, humanidade e sociedade, enquanto ela evolui. Pontos como a medicina fazem com que a gente olhe com esperança para esse novo momento.
Patrícia Lima é empreendedora, fundadora da marca de produtos de beleza Simple Organic. Formada em Publicidade, Jornalismo e Moda, a executiva já palestrou nas Conferências das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP-27 e COP-28) e tem o foco emconectar a sustentabilidade à indústria da beleza.
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