O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), afirmou nesta sexta-feira (8) que poderá ir à Justiça contra a Enel, concessionária de energia, pela falta de acordo com a empresa que acaba por travar a implementação de ônibus elétricos na cidade.
Na discussão, revelada pela Folha, a prefeitura diz que a Enel orçou em R$ 1,6 bilhão todo o serviço para a construção da infraestrutura necessária para carregar as baterias dos veículos nas garagens. “A SPTrans está conversando [com a Enel X], vamos levar o tema até o dia 15 de março. Se não houver acordo, vamos ter que partir para o Judiciário”, disse Nunes.
Procurada pela reportagem nesta sexta, a Enel disse que o valor total para eletrificação varia de acordo com o tipo de solução em cada local e desconhece o valor citado pelo prefeito. “O valor mencionado de R$ 1,6 bilhão não está correto, pois soma os valores de todas as alternativas até aqui analisadas”, afirma a concessionária, em nota.
A prefeitura tem como meta trocar 2.600 ônibus a diesel por modelos movidos a bateria, o equivalente a 20% de toda a frota, até o final deste ano. A intenção é que esta seja uma das bandeiras do prefeito, que tentará se reeleger.
A SPTrans, estatal responsável pelo transporte público municipal, disse já ter negociado a compra com fabricantes. Mas, sem a garantia de que a infraestrutura elétrica de carregamento será feita, a compra não pode ser concluída.
Em entrevista à Folha publicada na terça (5), Gilmar Pereira Miranda, secretário-executivo da pasta de Transporte e Mobilidade Urbana da cidade, disse que previa gastar aproximadamente R$ 650 milhões com as obras feitas pela Enel X.
“O único ponto, hoje, dificultoso, é a infraestrutura nas garagens por causa da distribuição de energia elétrica. Pensando agora em R$ 1,6 bilhão, é um valor extremamente elevado”, disse o secretário, na ocasião.
Nesta sexta, o prefeito chegou a questionar a capacidade da Enel para realizar o processo de eletrificação das garagens. “Eles agora apresentaram uma conta de R$ 1,6 bilhão para fazer a infraestrutura para o carregamento das baterias. Tenho a impressão de que [a Enel] não tem condição de atender, não tem compromisso com a cidade e jogam preço exorbitante para justificar o seu não atendimento”, disse Nunes.
“Sem querer ser leviano, é uma impressão que tenho. Estou colocando um sentimento pela conversa do dia, porque essa turma é só desculpa o tempo inteiro, né”, prosseguiu o prefeito.
A relação entre Nunes e Enel é conflituosa desde o apagão que atingiu a cidade em novembro de 2023. A gestão Nunes chegou a entrar na Justiça contra a empresa.
São Paulo contabiliza, hoje, apenas 84 ônibus movidos a bateria. A prefeitura fez empréstimos de R$ 5,7 bilhões junto ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), Banco Mundial, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil para atingir a troca de 20% da frota —estimada em 13 mil veículos.
Este dinheiro deverá ser usado só para a compra dos veículos —os gastos com infraestrutura não estão incluídos no valor. Cabe às empresas de ônibus pagar pelo serviço, mas os empresários disseram para a prefeitura que não dispõem do dinheiro.
De acordo com especialistas, o processo de eletrificação é complexo.
Um estudo publicado pela ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos) aponta que as garagens precisam de adequação, com a criação de áreas específicas para esse tipo de veículo, para o estacionamento dos ônibus e o carregamento das baterias, com cobertura, maior distanciamento entre os coletivos, equipamentos próprios, isolamento de piso e inclusão de profissionais com formações específicas.
“A depender do volume de carregadores implantados e utilizados de forma simultânea, será necessário que a subestação possua alta tensão”, afirma o documento, alertando para a necessidade de investimentos para além dos limites da garagem e do terminal.
Até o momento, a Enel diz que instalou a rede em quatro garagens, com capacidade para abastecer 50 ônibus elétricos.
A reportagem teve acesso ao projeto de infraestrutura para a cidade. O documento divide o processo de implementação em plano imediato, curto, médio e longo prazo.
O plano imediato, por exemplo, consiste na instalação de 18 carregadores em 11 pontos de operação, sem a necessidade de obras na rede de distribuição. Essa etapa deve ser concluída em 45 dias.
Já o plano de longo prazo pode durar de quatro meses a um ano e meio, com a necessidade de realizar obras nas garagens e no sistema de distribuição para instalações de alta tensão.