Seis em cada dez homens brasileiros acima dos 50 anos nunca realizou qualquer exame ou fez isso há mais de um ano para detectar hiperplasia benigna da próstata (HPB), de acordo com pesquisa da farmacêutica Apsen em parceria com as (seccionais de São Paulo e do Rio de Janeiro da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), realizada pela Ipsos.
Com o passar da idade, a próstata naturalmente cresce (daí o nome “hiperplasia”), mas isso não representa um problema em si (por isso é definida como benigna). A condição afeta mais da metade dos homens com mais de 50 anos, segundo o Ministério da Saúde. A taxa sobe para 80% aos 90 anos.
Estima-se que metade apresentará sintomas, o que exige acompanhamento e, em alguns casos, tratamento. Isso porque a hiperplasia pode afetar o ato de urinar, elevando o risco de complicações sérias na bexiga e nos rins. Além disso, os sintomas se confundem com os de câncer de próstata, uma condição completamente diferente e que também merece atenção. Afinal, ambos os quadros são altamente prevalentes.
Por isso, o médico Mauro Muniz, presidente da SBU-RJ, se preocupa com o dado revelado pela pesquisa. É verdade que não existe uma recomendação de exames de rastreio para hiperplasia entre a população masculina em geral. Mas, segundo Muniz, mesmo na presença de sintomas, o paciente não costuma buscar a avaliação médica.
Muniz frisa que modificações na forma de urinar não devem ser encaradas como normais devido ao envelhecimento, e precisam, sim, ser investigadas. “O idoso se acostuma a algumas coisas. Pensa que, ao ficar velho, vai urinar mal, nas calças, no dedão do pé. Ele acha que isso faz parte da idade, deixa o tempo passar e não busca acompanhamento.” Acontece que esse tempo pode ser a diferença em termos de expectativa de vida.
A pesquisa foi feita por meio de um painel online. As perguntas foram apresentadas a 500 respondentes entre 22 a 28 de julho.
O que é a hiperplasia prostática benigna?
A próstata é uma glândula que só homens têm. Fica na frente do reto, abaixo da bexiga, “abraçada” na parte superior da uretra (o canal por onde passa a urina). Sua função é produzir um líquido que compõe o sêmen, que nutre e protege os espermatozoides.
Em jovens, a próstata pesa cerca de 20 gramas e é do tamanho de uma ameixa. Com a idade, ela cresce. O problema, destaca Muniz, é quando ela começa a bloquear a uretra, o que leva a sintomas urinários. Eles podem ser:
- Dificuldade para urinar
- Jato fraco
- Necessidade de esforço para iniciar a micção
- Sensação de que a bexiga não foi totalmente esvaziada
- Gotejamento após “terminar o xixi”
- Levantar várias vezes à noite para urinar
Conforme um manual da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), disponível na biblioteca virtual da Universidade Aberta do SUS, o risco de um homem precisar tratar o aumento prostático é de 30% (com medicamentos). Já a probabilidade de precisar do tratamento cirúrgico é de 10%.
A demora em buscar diagnóstico e tratamento pode levar a complicações sérias na bexiga, como infecções recorrentes e surgimento de cálculos (conhecidos popularmente como pedras). Também pode comprometer os rins – em casos mais graves, há insuficiência renal.
E o câncer de próstata?
Na pesquisa, 60% dos homens disseram acreditar que um dos riscos de não tratar adequadamente era o câncer. No entanto, isso não é verdade. Embora os sintomas sejam parecidos e possam se confundir, as duas condições não têm nenhuma relação.
Em primeiro lugar, porque acometem regiões diferentes. Quando explicam isso, os médicos costumam comparar a próstata a uma mexerica. O câncer costuma afetar a casca (a periferia), enquanto a hiperplasia ocorre nos gomos.
Mas, assim como a hiperplasia, o câncer de próstata é altamente prevalente. Segundo o Ministério da Saúde, ele é o segundo tipo de câncer mais incidente na população masculina, e é a segunda maior causa de óbito por câncer nesse público. O Instituto Nacional de Câncer (Inca) estima uma média de 71,7 mil novos casos por ano.
Investigação e diagnóstico
Após apresentar as queixas a um urologista, o paciente será avaliado. O diagnóstico de hiperplasia pode ser feito com o exame de toque retal e/ou um ultrassom, conforme Muniz.
Se o médico observar alguma alteração de consistência na próstata durante o exame de toque retal, pode desconfiar de câncer e, aí, pedir uma biópsia. Ela também pode ser solicitada após exame de imagem ou resultado de PSA elevado (exame que afere os níveis de uma proteína produzida pelas células epiteliais da próstata, que serve de marcador para câncer).
Rastreio
A recomendação de que homens a partir dos 40 anos ou 50 anos se submetam a exames de toque retal e/ou PSA periódicos, mesmo sem apresentar sintomas ou histórico de câncer na família, é marcada por discussões.
Conforme já mostrou o Estadão, há anos o Ministério da Saúde e o Instituto Nacional do Câncer (Inca) não recomendam o rastreamento populacional sob o argumento de que estudos científicos verificaram que programas de rastreamento não têm grande impacto na redução de mortalidade pela doença e podem causar danos à saúde do homem.
Isso porque parte dos tumores diagnosticados podem ser do tipo indolente, que crescem lentamente e dificilmente se espalham para outros órgãos. Nesses casos, o paciente diagnosticado tem um risco aumentado de passar por um tratamento que seria desnecessário e que pode deixar sequelas como incontinência urinária e disfunção erétil.
Por outro lado, algumas sociedades médicas pontuam que esperar o homem manifestar algum sintoma da doença para orientá-lo a realizar os exames pode ser arriscado, dado que os cânceres de próstata em fase inicial geralmente não dão sinais claros. Assim, não fazer o rastreamento populacional poderia levar a diagnósticos de tumores em fase já avançada, quando as chances de cura são reduzidas e os tratamentos são mais sofridos.
O que é consenso entre as autoridades de saúde é que o adequado é que o homem, principalmente a partir dos 40 ou 50 anos, deve procurar um médico para análises individualizadas e discussão sobre a necessidade de realização dos exames.
Muniz avalia que, desde a adolescência, homens devem se consultar periodicamente com o urologista. Pelo menos anualmente. “A mulher sai do pediatra e vai para o ginecologista. O homem sai do pediatra e fica ‘abandonado’. Só vai ao médico se sentir alguma coisa. O homem precisa de atendimento também.”
“Esse é um dos fatores que contribuem para o gap entre mortalidade feminina e masculina. Há várias teorias sobre isso, mas um ponto é: o homem se cuida menos que a mulher”, conclui o médico. /COLABOROU FABIANA CAMBRICOLI